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Obra de Pedro Quintanilha |
Pedro Pintura, Pedro Quintal
Cidade dos loucos
cidade dos morros
ruas tortas, becos gordos
cachorros soltos
crianças, cirandas, bandas
casas sem rebocos
e sem número à beira
da beira da beira.
Cidade de cores destoadas
pouco brilho, sem definição
terra de campo
terra de pouso
grande espaço para o voo.
Alegre são os olhares
Nesses, há a verdade
de uma terra mais livre
do que seu chão
e de gente mais firme
do que suas rochas.
Entre esses olhares
há o de Pedro,
Pedro pintura
brilhava as cores
coloria o brilho
e via, nas ruas tortas
todos os caminhos
do mundo.
Pedro pintura
pintava, riscava
Pedro quintava
arte, rasgava a vida
e trazia ela para o
seus quadros
com a força da poesia.
Suas tintas sangravam
Quintais e sopros.
Seu pincel eram artérias
a pulsar e expulsar cores
e formas e sonhos.
O cavalete, os seus pés
a tela era o seu corpo.
E Pedro pintura
Pedro Quintal
solitário, reunia
em cada traço
em cada gesto fixado
no desenho em que vivia
toda a dor de um povo
toda a melancolia
de um século de rejeição
de um povo rejeitado.
E mais do que dor
de um povo, de uma cidade,
de um bairro, de uma vila
o que mais me doía
o que mais eu sofria
ao ver os quadros de Pedro
era ver revelado
o infinito de suas angústias,
profundamente belas
como rosas desfolhadas
na madrugada de um jardim.
Não era Pedro
que dizia algo
pintando quadros
fazendo poesias
com seu sangue tintas
mesmo que a cidade
ficasse mais bonita.
Era a sua arte
era o seus quadros
que o desenhava.
Pedro se imprimia
imprimia seu olhar
de morro, do beco gordo
sua face lívida
o quintal inteiro
que há lá dentro
de seu olhar de louco.
Uma loucura presa
contida em seu corpo
quintal, em seu corpo
jardim, uma loucura
que cura o mundo.
Sua pintura fazia
a loucura voar
libertar-se para outros
pousos.
E, de repente, você
também se via
dentro de uma tela!
Não há como não chorar
vendo uma pintura
de Pedro.
Ele, mais do que artista
é um médico de alma
e nos devolve
para dentro de nós mesmos.