sexta-feira, 30 de julho de 2010

Mama

Verte do peito o sangue na boca
Derruba neste momento
Todas as teorias e lamentações
Somos uma só agora
Transbordadas de poesia

Este alimento é de graça
É puro, ninguém pode roubá-lo
Ninguém pode destruí-lo
ele é só seu, filha

bebe o seu leitinho quente
passa a mão no teu peitinho
que é também teu travesseiro
seu naninha
sua segurança

onde tu tens a paz
a paz verdadeira
a paz mundial
onde tu dormes tranqüila
e nada e ninguém
te pertuba

quando cresceres, filha
for mulher e sofrer
a dor de ser mulher
e chorar, podes vir filha
Podes vir no regaço de tua mãe
Podes deitar nestes velhos braços
Cansados e encostar tua cabeça
Em meu peito,
Onde por tantas vezes
Tu te alimentaste e dormiste
Quando criança.
E tudo será pequeno
Perto deste abraço.

sábado, 24 de julho de 2010

Para um amor que se foi

Após a tua presença
Tudo foi eterna ausência
Na minha triste vida

As flores que brotavam
As musicas que tocavam
Eram para a tua vinda.

Hoje vejo a sua imagem
Nos cantos da casa, na porta
Como se fossemos um ainda.

Tu me segues nas paisagens
Gravado na minha sombra
E eu, não sei se fico ou se fujo.

E mesmo se eu não te quisesse
Minha alma sairia em tua busca
Nas noites claras e nos dias mais escuros.

Porque vivo para ser tua
É que sonho com a pronúncia
Do meu nome pelos teus lábios.

Às vezes, sou eu que te procuro
Procuro-te no cheiro da bebida
E no nascer de cada sábado.

Em que tu chegavas, minha vida
E continuo a procurar sem fim
Nas horas do dia, nas folhas do calendário.

Parece que tu não saíste da cama
Parece que tu não saíste da cozinha
E faço nosso café de todas as manhãs

O meu nome cravado em tua pele
O teu nome tatuado em minha boca
Nossos pensamentos contra o esquecimento

Ma olho para o lado, a cama vazia
E me desespero em silêncio,
É como se eu morresse um pouco
A cada dia que amanhece
Sem você.

A busca do verdadeiro amor

Entre canções e histórias
O amor se inventa
De lenda a pura poesia

O amor se cria e é parido
Nos versos mais antigos
Nos cânticos da Bíblia
Nos mitos e na crua dor
De ser por Deus um desígnio

Tomou para si o ser humano
O destino de amar sem domínio
De amar para sempre vaso
Coração esmagado e doido

O amor se torna grata maldição
De poucos e fiéis escolhidos
Para os quais, só se sobrevive
Se existe o verdadeiro perdão
Porque somos todos vencidos
Pela fraqueza de nossos vícios
Humanos, e sempre solitários

Mas vence o amor que é vivido
Que é compartilhado
Que é parido na dor
E no perdão de todo dia

Porque em todos os dias
Há tempo para destruí-lo
O amor inteiro
Transformando-o em pedaços
E em saudade
Há chuva penetrando nos caminhos
Mas a aliança do amor
Só se encontra uma vez
A maioria dos humanos
A perdem por vaidade
Por não saberem escutar
E olhar com carinho a face
Do ser amado.

Muitos morrem por amor
Mas poucos o vivem
Na sua toda plenitude
Porque na verdade
Não existe metade
Mas uma incompletude
Que com a união não cessa

Unimos a um outro ser
Para mais nos perder
Do que para nos reencontrar
Porque viver é buscar
E nunca ter
E amar é saber
Partilhar a imperfeição
Para talvez se chegar mais próximo
Do olhar de Deus por nós

Que seja feita da lágrima
A misericórdia,
E das mãos unidas
O carinho mítico
De se viver todos os dias
Um grande e verdadeiro amor.

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Partilho com todas as fêmeas 
Os mistérios da vida
 O ciclo do tempo 
A paridez da lua 
O sentido de ser natureza 

 Partilho com todas as fêmeas 
Os fluidos de ter um corpo
 Matéria presa à terra e à água 
Cheirando a sangue e leite 
De gosto mítico e perene 

 Partilho com todas as fêmeas 
O brotar, o nascer, o florir 
De todas as sementes 
A lágrima de quem gera 
 e de pertencer a quem foi gerado 
E a eternidade das pedras 

Enquanto chora o vento 
 Partilho com todas elas 
Mamíferas, insetas, reptas 
Peixas, moléculas, anfíbias 
Plantas, terra, água e árvores 
O mistério da beleza

Deus menino

Jesus dormiu num berço
De palha
Jesus sonhou como um menino
Semblante lírico
E acordou chorando
O peito de sua mãe

Acordou com fome
Pegou com suas mãozinhas
O peito de sua mãe,
Acareciou-o e procurou-o
Com sua boca
Se aninhando bebê menino
No peito de sua mãe.
Minha bebe leva a mão
No rosto quando dorme
Leva a mão no rosto
Como um sonho.

Ana

Tu és fruto do ventre
Saída das entranhas da terra
Brota como uma pêra madura
Da mais leve flor e abelhas
Que descobrem o sumo
Mais caro e raro
Do seu eu profundo

Dorme Ana
Dorme como a raiz
Inteira em busca de nutrientes
Luz e sombra
Embaixo de tantas lembranças
De tantos aromas e folhas

Ana, tu pequena
No balanço,
Nunca esqueças
O tempo não passa
nas árvores.
O corpo da mãe

O corpo da mãe não lhe pertence
Jorra sangue, salta leite
Seu corpo é casa roubada
Onde sua cria dorme
Estrada aberta sem porteiras
Onde as cria caminha infinitamente
A mãe não tem vergonha
Seu corpo é visto por todos
Como uma estátua disforme
Nua ela pare, nua ela alimenta
Seus seios despencam às vistas/
De todos que passam nas ruas
E de todos que andam a sua volta
Seus seios não são mais seios
Grandes, duros e doloridos caem
Direto na boca gulosa de seu filhote
Seus seios são nada mais que tetas
Tetas que amamentam
Tetas que ninam
Tetas que choram leite e sangue
De bicos cascudos, grossos e rachados
Tetas abertas
Em que seu filhote se pendura
Se pendura como broche
A mama da mama
Morde o filhote
Que mia e morde
A mama que mia
Toda mulher
Vira bicho quando gesta
Vira bicho quando pare
Vira bicho quando mãe
Toda mãe
Vira bicho quando amamenta
Seu bichinho
Vira bicho quando precisa
Defender seu bichinho
Toda mãe sabe
Que ser mulher
É ser bicho
Antes de ser gente
Com sua carne
Com seu sangue
Com seu leite
Com seu instinto
Que fareja o macho
Que fareja a cria
A mulher, a mãe
O bicho
Verifica e protege
Seu filhote, sua cria
Seu bichinho
Seus braços
Suas tetas, seu colo
Seu ventre, seu nariz
Alimenta, nina, embala
Protege e educa
O ser humano.